Marcelo Carneiro da Cunha
Pois não é que o mundo conspira? Bem na hora que sai um livro que finalmente explica a misteriosa razão por trás da decisão que cada mulher toma na hora em que resolver que agora vai, o G-7 vira G-20, um tufão acerta em cheio a Indonésia, o mundo sacode e o Brasil vira sede das Olimpíadas de 2016 com o Lula chorando em todas as primeiras páginas, universo a fora.
O resultado é que o que era para ser o grande assunto da semana, do mês, da década, capa da Veja com alguma manchete esculhambando com o Lula (afinal, para a Veja, a culpa por tudo que se move sobre a Terra, sempre é de quem mesmo?), o enorme assunto e a revelação que finalmente trouxe alguma luz para esse mistério que nos persegue há séculos, passou despercebido.
Até agora. Porque, na solene tradição dessa coluna, de sempre, mas sempre mesmo trazer a todos o que realmente importa, vou aqui e em público revelar a resposta para um mistério tão, mas tão incompreensível que deixa os de Fátima no chinelo. Portanto, por favor, removam as crianças da frente desse site e aqui vai:
Por que as mulheres fazem sexo
O livro é dos pesquisadores Cindy Meston e David Buss, e segue a norma mundial das publicações de pesquisas sobre mulheres: a) tenha sempre ao menos uma pesquisadora na turma e b) tenha vários PH.D antes de falar qualquer coisa sobre um tema tão explosivo. O livro reúne ambas condições, e portanto, pode ser lido sem maiores temores.
Se chama "Why women have sex - understanding sexual motivations, from adventure to revenge, and everything in between" e nos tranquiliza ao nos informar que existem 237 razões pelas quais as mulheres fazem sexo.
Caramba! E nós que pensávamos que havia uma, apenas uma, nada mais do que uma, e era a única e se chamava AMOR!! Não vinha daí a superioridade das mulheres sobre os homens? Enquanto a gente fazia sexo pelos motivos mais baixos entre os baixos, de acordo com a nossa natureza selvagem e promíscua de seres inferiores, as mulheres transavam por amor. Se isso não é verdade, se mais esse mito foi por água abaixo, mas o que nos resta?
237! Isso parece um Kama Sutra motivacional, minha gente. Eu nunca acreditei no Kama Sutra. Nunca me pareceu razoável que alguém se dispusesse a se colocar na posição "lótus enfia o dedo do pé na narina da amada" sem sair disso com a alma abandonando o corpo e a lombar em frangalhos. Eu sempre calculei o número total de posições como algo entre duas e cinco, sendo que pelo menos três delas me pareciam nada mais do que exagero de adolescentes. Agora me informam, e eu obedientemente repasso a todos os leitores da coluna, que as mulheres têm 237 motivos para fazer sexo. Que a minha avó Jovita jamais saiba disso.
Basicamente, se eu entendi o que o livro diz, as mulheres são seres frios e calculistas e que fazem sexo pelos motivos mais interesseiros do planeta.
Elas transam pra ganhar um emprego ou para processar o chefe na seqüência. Para assegurar uma boa carga genética para o pimpolho, ou para assegurar uma boa barriga de tanquinho para a sua cama. Para mostrar para o mundo que ela é a maior deusa do sexo que a Terra ainda não conheceu. Para deixar claro ao seu homem quem é que manda. Para deixar claro ao seu homem que ela gosta mesmo é do vizinho do 602. Para deixar claro ao vizinho do 602 que ela é uma mulher casada, bem casada, e que isso é apenas um momento junto à parede do corredor, para ambos. Para obter alguma vantagem acadêmica. Para ganhar o prêmio Nobel, ou ao menos uma dor agradável nas costas. Para se sentir bela e desejada. Para fazer aquela vadia do Contas a Pagar se sentir um traste, porque é ela quem pega o gatão do RH. Para se alimentar melhor. Para queimar calorias de um jeito um teco mais interessante do que duas horas na esteira vendo o GNT. Para ganhar presentes caros. Para ganhar presentes baratos. Para produzir endorfina e se livrar da enxaqueca. Para ter algo mais divertido na hora do almoço do que passar uma hora no bufê de quilo perto da empresa.
Quantas já foram? Puxa, ainda faltam várias. Em quantos os estimados leitores e leitoras podem pensar e quantos podem adicionar a essa lista?
Para nós, homens, fazer sexo sempre foi algo simples e compreensível. Sempre fizemos sexo porque sim e agora, quanto mais agora melhor. Era arriscado deixar pra depois, porque cada saída da caverna podia representar o nosso encontro com o Criador, ou, pior, com um destruidor cheio de dentes e com uma apreciação especial pelo nosso lombo.
Com a nossa sensibilidade masculina, sempre soubemos que sexo era algo capaz de nos tirar da dureza cotidiana e nos remeter para um mundo bem mais interessante, ao menos por alguns segundos, antes dos nossos orgasmos. Todos sabem que a rapidez do orgasmo masculino está ligada ao fato de sabermos que ali do lado de fora poderia haver um tigre de dente de sabre, uma onça ou um marido à espreita.
Somos seres simples e resultantes da Evolução. Somos darwinianos, acima de tudo, e queremos espalhar nossa sementinha pelo mundo, ou pelo maior número possível de mulheres, enquanto temos tempo e energia, se me entendem.
As mulheres não têm essas pressas ou essa clareza.
Assim, eu, você, o senhor aqui ao lado, sempre nos pegávamos pensando, o que afinal se passava na cabeça de nossa amada, ou desejada, salve, salve, naquele restaurante caríssimo para onde a tínhamos levado, na esperança de a noite terminar em uma troca justa? Ela estava a fim, ou aquele olhar era para a pizza? Ela se sentia curiosa a nosso respeito, mas ainda não pronta para saber mais sobre uma partezinha essencial da nossa identidade masculina? Ela queria desesperadamente o nosso corpo, mas ainda não estava preparada para se entregar a essa paixão, ou estava entediada o bastante com a nossa conversa para pegar no sono ainda no carro, enquanto lidávamos com a frustração e ficávamos pensando em quantos jantares mais, antes de alguma coisa finalmente acontecer e o amor reinar?
Agora ficamos sabendo que não era nada disso, não era amor, nunca foi. Era outra coisa, outras 237 coisas, nenhuma delas a que a gente imaginava, ou torcia para que fosse.
Na verdade, era, sempre foi, sempre vai ser, ela mesma. Ela não está pensando no nosso coração vagabundo, mas sim se ela por acaso escolheu a lingerie certa. Se a resposta interna for sim, sim. Se achar que errou justamente porque a renda da perna não combina com o prendedor de cabelo, vocês vão ter um final de noite bem mais melancólico do que você esperava. Ela está pensando no que precisa fazer no outro dia e se pode se auto destruir um pouco com você e ainda se sentir uma deusa diante do espelho na manhã seguinte. Caso sim, sim. Caso não, azar o seu. Se ela justamente hoje esqueceu de se depilar, esqueça. Se uma unha lascou durante a sobremesa, ela está se sentindo um caco e precisa de um pote de sorvete e de umas duas horas de Sex and the City pra se recompor. Se existe uma coisa nesse instante de que ela não precisa, é de você.
Você, pobre homem, pobre patinho, está diante de um sistema muito mais complexo do que o seu na hora de fazer as suas escolhas, e que ainda, por tragédia, sente um enorme prazer quando diz não.
Não pense no agora, quando vocês dois se tornaram seres iguais diante da lei. Pense nos milhões de anos, desde a pedra lascada até o tevê de plasma, em que cada um de vocês precisou lidar com a dureza do mundo com os recursos de que cada um dispunha. Você, saindo da caverna, podia acumular bens trocáveis. Para ela, que ficava ali dentro inventando a pintura rupestre com as amigas, havia apenas um bem de troca. Ela aprendeu a utilizá-lo da melhor maneira possível para quem vivia em cavernas, e ainda não mudou tanto assim desde que passamos para apartamentos da Cyrela, com 2,3 filhos e férias no Guarujá.
Somos todos resultado do nosso passado, mais do que do presente, menos do que do futuro. Eu até acho que os 237 motivos serão bem menos daqui a um tempo. Nesse dia, e finalmente, as mulheres e seus motivos talvez se tornem compreensíveis, ou ao menos passíveis de serem contados usando apenas os nossos dedos dos pés e mãos. Eu gostaria de estar por aí para ver, mas como me conformei em viver apenas 250 anos, acho que vou ter que deixar essa experiência para vocês, jovens. Aproveitem. Eu sou daqueles que acreditam que o mundo é melhor quando mais simples, mais simples quando mais redondo, melhor quando mais humano. A ele todos, e boa sorte.
Artigo publicado no Terra
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