AMAR

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave
de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.


Autor: Carlos Drummond de Andrade

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Quando o mundo perde a cor

Vanuza Borges


 A depressão é uma síndrome psíquica caracterizada por desânimo, sentimentos de melancolia, irritação ou medo. Identificá-la, porém, não é tão simples quanto a sua definição. Conhecida como a doença do século XXI, atinge hoje cerca de 450 milhões de pessoas no mundo, segundo levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS).


Nas próximas duas décadas, segundo a mesma pesquisa, a depressão tende a ser a patologia mais comum em todos os continentes, superando o câncer e as doenças cardíacas. Mesmo com informações tão contundentes, ainda sobram resistência, preconceito e dúvidas sobre tratamento, prevenção e cura. Por anos a fio, os depressivos foram vistos como pessoas “frescas” ou loucas. Este estigma ainda persiste, levando muitos a não procurar atendimento médico. Segundo o psicólogo Gleyson Reis, 36 anos, de Apucarana, é muito difícil aceitar nossas fraquezas. Por isso, num primeiro momento, é comum negar. “Um dos sintomas mais comuns para esconder essas falhas é o isolamento. A pessoa procura ficar sozinha para mais ninguém perceber”, pontua. De acordo com ele, a negação é o primeiro mecanismo de defesa e a aceitação, o último.


A demora em admitir a depressão faz com que muitos passem por quadros depressivos sem procurar ajuda para o problema, tornando a patologia recorrente. Segundo o Ministério da Saúde, 25% dos casos são crônicos. A subjetividade é tida como o grande limitador, diferente de outras doenças em que os sintomas são visíveis.


“Coisa de desocupado”
Psicóloga
 Débora Menegazzo alerta que pessoas muito irritas podem ser 
depressivas

Segundo a psicóloga, Débora Mengazzo, 37 anos, de Apucarana, a maioria dos pacientes consegue continuar trabalhando ou cumprindo suas tarefas diárias, apesar de fazer com mais esforço e menor rendimento.

“Infelizmente, muitas pessoas passam por quadros depressivos acentuados e logo que melhoram abandonam o tratamento. Esta atitude torna-as vulnerável ao estresse, leve desânimo e irritação”, argumenta. De acordo com a profissional, existem, ainda, quadros crônicos desde seu início, que se prolongam por anos, com melhoras pouco significativas e retornos depressivos fortes.



A psicóloga alerta que a depressão não está associada somente ao caráter melancólico. “Pessoas muito irritadas, impacientes e nervosas também podem estar depressivas”, diz.

Uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2000, mostrou que o número de mulheres com depressão unipolar quase o dobro a de homens. A prevalência de episódios é de 1,9 por cento no sexo masculino e de 3,2 por cento no sexo feminino. A vulnerabilidade da mulher é maior no período pós-parto, na menopausa e pós-menopausa.


Mulheres lideram o ranking
: Psicólogo Gleyson Reis 
afirma que feito o tratamento completo a cura é quase certa



Para o psicólogo Gleyson Reis, historicamente as mulheres absorvem mais os sentimentos, toleram mais certas coisas que as insatisfazem, principalmente nos relacionamentos afetivos. Essa postura, com o tempo, leva a desacreditar no seu próprio potencial. “Altera a maneira de se perceber, afetando a auto-estima e levando à depressão”, sustenta.

Histórico Familiar


De acordo com estudos, ter um dos pais com depressão aumenta de 2 a 4 vezes o risco da criança desenvolver a doença ao longo da vida. “As tendências se repetem, seguindo os mesmos motivos. A predisposição precisa ser alimentada. O ambiente que vai emitir os estímulos determinantes. Se uma criança cresce em uma casa com pais tristes vai assimilar que a tristeza é normal ou pode achar que ela é a causa da tristeza”, explica o psicólogo.


Reis observa que a depressão não tem idade. Entretanto, é na fase adulta, entre os 20 e 40 anos, que compreende o maior índice de casos.


SINTOMAS

• Alteração do apetite (falta ou excesso de apetite);
• Distúrbios do sono (sonolência ou insônia);
• Fadiga, cansaço e perda de energia;
• Sentimentos de inutilidade, culpa, falta de confiança e baixa auto-estima;
• Prejuízos da concentração e memória;
• Pensamentos negativos, ideias recorrentes ou desejo de morte;
• Desinteresse, apatia e tristeza;
• Alterações do desejo sexual;
• Irritabilidade;
• Manifestação de sintomas físicos, como enjoos, dores musculares e abdominais.


CAUSAS

A depressão age de forma peculiar em cada pessoa. Pode ter origem espontânea ou ser desencadeada por fatores orgânicos ou ambientais, observa a psicóloga Débora Menegazzo. “Para um diagnóstico correto, os sintomas devem ser persistentes, porque todos nós podemos passar por episódios de tristeza, raiva, desânimo ou irritação”, afirma. O recomendado, de acordo com a OMS, é procurar a ajuda de um profissional de saúde sempre que esses sintomas persistam de forma aguda por mais de duas semanas.


As causas, segundo Débora, geralmente, estão associadas à interpretação pessoal dos eventos da vida e das habilidades que possui. Ela ainda acrescenta que a perda de pessoas queridas, dificuldades relativas a emprego, mudança de cidade, problemas financeiros e expectativas não alcançadas também influenciam. Além desses motivos, os de ordem médica deixam os pacientes vulneráveis, como câncer, doenças cardíacas, diabetes, tireóide, Parkinson, Alzheimer, epilepsia, infecção por HIV e derrame cerebral.


GRUPOS DE RISCO


• Histórico familiar de depressão;
• Sexo feminino – incidência da doença é maior em mulheres, principalmente no período pós-parto, na menopausa e pós-menopausa;
• Idade mais avançada;
• Episódios anteriores de depressão;
• Acontecimentos estressantes;
• Dependência de droga;
. Pessoas com tendência para ansiedade e pânico.
TRATAMENTO E CURA

A depressão é considerada uma das patologias mais tratáveis da medicina e da psicologia, analisa a psicóloga Débora Menegazzo. “Os depressivos jamais devem desistir de recuperar a saúde e não se acomodar com maus resultados ou recuperação incompleta”, frisa a psicóloga.

De acordo com a profissional, o tratamento se baseia em várias medidas, envolvendo medicamentos antidepressivos e ansiolíticos, psicoterapia, recondicionamento físico e atitudes voltadas à recuperação da qualidade de vida.


Para obter a cura completa e evitar recaídas, Gleyson Reis enfatiza que é necessário aguardar a alta. “Alguns casos são tratáveis somente com terapias, enquanto outros necessitam ser complementados com medicamentos. A terapia vai identificar a causa e o remédio vai melhorar o humor em um curto espaço de tempo, auxiliando na recuperação”, diz.

Segundo ele, quase 100% dos pacientes que fazem o tratamento completo ficam curados. Reis recomenda que a família leve a pessoa com sintomas depressivos ao serviço de saúde, sem questionar muito. “Tentar não invadir o espaço dela. Ficar conversando demais, porque, às vezes, o assunto incomoda. O ideal é levar ao consultório e ficar de olho, principalmente quando há tendência de suicídio”, aconselha.

O apoio da família é essencial, mas, segundo Débora, tentar motivar demais ou cobrar “força de vontade” do doente pode acabar prejudicando o quadro. “Compreensão, apoio, incentivo adequado e atenção são alguns comportamentos importantes para quem está próximo da pessoa doente”, diz. Ela indica também a leitura de livros, revistas e sites especializados sobre o tema para a família. “A informação ajuda a compreender melhor a doença e o paciente”, assinala.

RECAÍDAS E SUPERAÇÃO

Durante uma atividade com colegas de trabalho, Lúcia*, 43 anos, descobriu que andava ansiosa demais. A reunião motivacional havia sido organizada por uma psicóloga para avaliar o comportamento dos funcionários. “Ela passou um exercício e fiz em apenas 15 minutos. Quando entreguei, a psicóloga sugeriu que procurasse ajuda profissional, porque o tempo estimado para realizar a tarefa era uma hora e meia”, recorda.

Lúcia não relutou. “Procurei de imediato. Há algum tempo não dormia direito, estava com insônia e muito estressada. Demorei a perceber que o meu ritmo apressadinho estava me judiando. Fazia três, até quatro coisas ao mesmo tempo”, conta ela, que, além de mãe, esposa e dona de casa, mantinha uma rotina de dois empregos e ainda fazia faculdade à noite

.
Ela fez terapia durante um ano, mas só o acompanhamento psicológico não foi suficiente. “Também precisei tomar remédios”, confessa.


Tão logo se sentiu melhor, Lúcia abandonou o tratamento por conta própria. No entanto, o que ela não esperava aconteceu: a depressão voltou. “Um sentimento de solidão me invadiu, um desânimo total, chorava demais, não saía de casa, nada me satisfazia”, lembra. Lúcia voltou a fazer terapia e a tomar remédios por dois anos. Há seis meses, recebeu alta.

Ela faz questão de enfatizar que o apoio da família e a fé em Deus foram essenciais para o processo de cura. “Em casa, o tratamento foi coletivo. Eles tiveram muita paciência e foram persistentes. Não desistiram de mim”, diz.
*Nome fictício para preservar a identidade da vítima.
Matéria publicada na Revista UAL/Jornal Tribuna do Norte de Apucarana

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Boa parte dos casos de câncer no Brasil poderia ser evitada

Cerca de 30% dos casos de 11 tipos de cânceres pesquisados poderiam ser facilmente evitados no Brasil, de acordo com um estudo divulgado nesta quinta-feira, com a adoção de uma dieta saudável, a prática de mais exercícios físicos e um controle de peso adequado.
O relatório Policy and Action for Câncer Prevention (Política e Ação para a Prevenção do Câncer), uma parceria do Fundo Mundial de Pesquisas sobre Câncer (WCRF, na sigla em inglês) e do Instituto Americano para a Pesquisa do Câncer (AICR, na sigla em inglês), calculou a porcentagem dos casos de vários tipos da doença que poderiam ser evitados também nos Estados Unidos, na Grã-Bretanha e na China.

Os pesquisadores calculam que um quarto dos casos de câncer em países de baixo poder aquisitivo como a China poderiam ser evitados com esses hábitos saudáveis. Em países desenvolvidos, a proporção sobe para um terço.

O Brasil, como país de poder aquisitivo considerado médio, se encontra no meio do caminho entre estas duas proporções, segundo o relatório.

Brasil

Ao todo, 11 tipos de câncer foram estudados no Brasil e na China: o de boca, laringe e faringe (considerado uma única categoria); esôfago, pulmão, estômago, pâncreas, vesícula biliar, cólon, fígado, mama, endométrio (mucosa uterina) e rim. Nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, o câncer de próstata também foi pesquisado.

Os cientistas concluíram que cerca de 63% dos casos de câncer de boca, laringe e faringe no Brasil poderiam ser prevenidos, igual à proporção americana, um pouco menor do que a britânica (67%) e maior do que a chinesa (44%)


Em termos absolutos, o maior impacto seria na prevenção do câncer de mama, que é o segundo caso mais frequente da doença entre as brasileiras, atrás apenas do câncer de pele.


O Instituto Nacional do Câncer calcula que 49 mil casos de câncer de mama devem ser registrados no país em 2009. Consequentemente, segundo os cálculos da pesquisa, quase 14 mil casos poderiam ser prevenidos.



Recomendações


"Esperamos um crescimento substancial dos índices de câncer com o envelhecimento das populações, o aumento da obesidade, com as pessoas menos ativas e consumindo cada vez mais comidas pouco saudáveis", afirmou Martin Wiseman, diretor da pesquisa.


"A boa notícia é que isso não é inevitável e ainda podemos evitar uma crise, antes que seja tarde demais."
Entre as recomendações dos pesquisadores estão:

  • as escolas devem encorajar a alimentação saudável e as atividades físicas;
  • instituições de ensino não devem vender alimentos pouco saudáveis aos alunos;
  • os governos devem encorajar a população a caminhar e andar de bicicleta;
  • os governos devem tornar leis as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS);
  • a indústria alimentícia deve fazer da saúde pública a prioridade durante todos os estágios da produção.

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1957: Os Nove de Little Rock

Em 24 de setembro de 1957, o presidente Dwight  Eisenhower envia tropas militares a Little Rock, capital do Arkansas, para escoltar nove escolares negros que deveriam frequentar uma escola de brancos.


Final da década de 50 nos Estados Unidos: com base numa sentença da Corte Suprema, todas as escolas do país foram conclamadas a eliminar as restrições raciais. Também em Little Rock, capital do estado de Arkansas, as autoridades escolares começaram a preparar um plano de integração.
Chegou-se a um consenso: seriam mantidos os colégios exclusivos dos negros, mas alguns escolares negros teriam permissão para frequentar os colégios dos brancos. Foram escolhidos nove candidatos negros, seis moças e três rapazes, que deveriam frequentar a Central High School no ano letivo que se iniciava, juntamente com 1.900 escolares brancos.

Resistência aberta

Para muitos, no sul dos EUA, era inaceitável a eliminação da segregação racial nas escolas. Um dos principais adversários da integração era o governador de Arkansas, Orval E. Faubus. Ele conclamou abertamente à resistência e ordenou às tropas da Guarda Nacional de Arkansas que cercassem a escola.
No dia 3 de setembro de 1957, os escolares negros tentaram, pela primeira vez, entrar no colégio. Foram impedidos pelos soldados, os quais receberam aplausos frenéticos da turba de brancos, reunida diante do prédio da escola. No dia 4 de setembro, Elisabeth Eckford, uma das escolares negras, quase foi linchada pela multidão. Os soldados presenciaram o incidente sem intervir.

Mas logo a imprensa americana divulgou os acontecimentos e as autoridades federais ficaram cientes do conflito. Uma sentença judicial obrigou o governador de Arkansas a retirar, finalmente, as tropas da escola. No dia 23 de setembro de 1957, os escolares negros tentaram mais uma vez assistir às aulas.

O New York Times informou sobre os acontecimentos do dia da seguinte maneira: "Uma turba de manifestantes em pé de guerra, aos berros e histéricos, obrigou hoje nove escolares negros a deixarem a Central High School. Apesar da presença de um grande número de policiais locais e estatais para proteger os negros contra ataques, essas forças policiais acabaram desistindo em face da fúria de cerca de mil manifestantes brancos e, por volta do meio-dia, ordenaram aos alunos negros que deixassem a escola. A tentativa de integração durou 13 minutos. Os negros foram escoltados pela polícia através da turba e levados para as suas casas, sem serem feridos".

A posição de Eisenhower

No entanto, diversos repórteres, especialmente os negros, foram atacados e espancados pela multidão. Na noite de 23 de setembro, o presidente Dwight Eisenhower fez um pronunciamento pela televisão, dirigindo-se ao povo americano: "Como se sabe, a Corte Suprema dos Estados Unidos decidiu que são inconstitucionais as leis sobre a segregação racial nas escolas. Nossa opinião pessoal quanto à decisão não desempenha qualquer papel na imposição do cumprimento da lei. A base dos nossos direitos e liberdades individuais é assentada na garantia de que o presidente e o Poder Executivo apóiam e impõem as decisões da Corte Suprema. Se necessário, com todos os recursos à disposição do presidente".

O discurso do presidente deixou duas coisas claras. Em primeiro lugar, Eisenhower não era exatamente um paladino do movimento em prol dos direitos civis dos negros. A sua argumentação foi mantida quase exclusivamente no nível formal. Mas também ficou muito claro que o presidente estava decidido a acabar com a resistência em Little Rock. O conflito em torno dos nove escolares negros transformara-se também numa luta de poder entre as autoridades estaduais e federais.

Primeiro dia de aula "normal"

Como a situação em Little Rock continuasse inalterada, Eisenhower pôs todas as unidades policiais e militares de Arkansas sob o comando federal, no dia 24 de setembro. Além disso, enviou mil homens da 101ª divisão, uma tropa federal regular, para Little Rock. Os soldados postaram-se diante da escola e dissolveram imediatamente toda tentativa de agrupamento de manifestantes. Cada um dos nove escolares recebeu um guarda-costas, que o acompanhou à sala de aulas, montando guarda à porta, todo o tempo.
Com tal proteção, os nove escolares negros puderam a 25 de setembro de 1957 frequentar, pela primeira vez, um dia inteiro de aulas no seu novo colégio. Mas os nove adolescentes tiveram de enfrentar, sem qualquer amparo, as provocações verbais, sociais e, em parte, físicas dos seus colegas brancos. 
Rachel Gessat (am)

FOTO: AP


Texto; Deutsche Welle

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