-Vai demorar para o médico atender?
-Não! Ele está atendo uma emergência. Um rapaz foi baleado, disse a atendente a mãe de uma adolescente que aguardava por atendimento. A menina parecia estar com cólica. A mãe olhou para filha e respondeu para atendente que ela iria aguardar.
-Não! Ele está atendo uma emergência. Um rapaz foi baleado, disse a atendente a mãe de uma adolescente que aguardava por atendimento. A menina parecia estar com cólica. A mãe olhou para filha e respondeu para atendente que ela iria aguardar.
A atendente se virou e me cumprimentou. Pediu os documentos de minha mãe para preencher a ficha. Neste momento, chegou um policial. Clima tenso. Ele disse que havia prendido um suspeito. Perguntava a um rapaz, de camiseta rosa e calça jeans, se ele tinha visto quem atirou. Ele disse que a aquela menina ali, ela tinha visto melhor.
Terminou de preencher a ficha e eu e minha mãe ficamos na recepção aguardando terminar a limpeza do quarto para entrarmos. Enquanto isso, mais pessoas chegavam perplexas. De repente dois conhecidos chegaram, um foi meu professor de jornalismo, e então perguntei: o que trazem vocês aqui. Quando me responderam não acreditei. Não podia ser verdade. “Mataram o fotógrafo Aristeu”. “Um assalto”. “Semana passada ele estava com a gente”. Quando vi a irmã dele saindo com os olhos cheios de lágrimas e dizendo não deu, não deu. Continuei sem acreditar.
Fiquei mais uns 40 minutos na recepção. Nesse tempo chegou mais um menino baleado. Eu e minha mãe ali, chocadas, desacreditas. Nos perguntávamos, será que a vida não vale mais nada?! Ainda lembro da última sexta-feira passada quando saímos juntas para pegar o ônibus de manhã para o trabalho e quando fomos atravessar a rua vimos uma mancha de sangue. Nossa! O que aconteceu aqui? Foi um acidente? - Foi sim. - Ontem à noite um carro em alta velocidade atropelou dois rapazes. Um deles não resistiu.
Na terça-feira à noite quando voltava do trabalho passei em frente ao salão da Igreja do jardim Colonial, onde era velado. Veio a minha mente o barulho da batida que ouvi na sexta-feira às 23h15 e a sirene cortante do Samu. Isto porque a rua do acidente fica a duas quadras da onde moro. Mais um jovem morto sem motivo. Motivo?!!! É verdade que não precisa de motivo para morrer. Mas morrer assim?! Sai com o amigo e quando volta para casa, a uma quadra de casa, vem um louco em alta velocidade e bate como se fosse em uma folha. Nem prestou socorro!
Socorro. Talvez era isso que as pessoas com quem cruzei pelo comércio, ontem à tarde, pediam. Os amigos do Aristeu estavam ali do lado do hospital com olhares desacreditados. Na Farmácia Saúde, que fica na esquina, a balconista comentava o fato com um colega e uma cliente, com a expressão, num sei a palavra a certa, talvez, fosse de desesperança. Na loja seguinte ouvi: foi uma judiação. Mais um pouco, e duas senhoras que conversavam na calçada diziam: só Deus para cuidar dos nossos filhos. Por quase todos que passava, ouvi vozes em tom de lamento. Os trabalhadores que entraram no ônibus, rumo a suas casas de formas geométricas repetidas, também não acreditavam.
Nem hoje quando peguei o jornal e vi na manchete “Fotógrafo é assassinado no centro de Apucarana” acreditei. Prefiro lembrar do menino que estudou no mesmo colégio que eu, sempre risonho, aquele mesmo que fez a crisma comigo, aquele que vi recentemente caminhando com a namorada perto da pracinha Duque de Caxias, ao lado do Colégio São José.
Meninos matando meninos. Me desculpem, mas não posso entender. Revólver e pistola viraram sinônimo de brinquedo de matar menino. Meninos, meninos, meninos.... Tão cheios de vida, de sonhos, sorrisos serenos..... Não quero perder a esperança. Hoje está sendo difícil demais como diz Jhon Donne a morte de qualquer homem me diminui porque sou parte da humanidade, me diminui muito mais quando este homem é um exemplo de presteza e serenidade.
Não posso desejar a morte de quem matou mesmo depois dos gritos de dor e desespero da mãe ter preenchido os corredores do hospital. Sou jovem demais para acreditar que a morte é a única solução. Talvez, quando eu chegar, se chegar diante de tantas incertezas, aos 50 anos diga que a pena de morte seja a solução. Mas ai não será mais a menina de hoje, será um ser amedrontado que cansou de contar os amigos que morreu assim: por nada, ou melhor, por um celular, uma câmera fotográfica, um carro, um pisão que deu no pé de alguém na boate...
Já estou cansada, angustiada, o dia que vai se esvaindo devagar e melancólico, pelo menos para mim. Sei que já me excedi, mas só para não esquecer, hoje quando desci do ônibus ali do lado das lojas do Baú e fui atravessar o sinal, ouço o barulho de uma batida e vejo um motociclista caído. Tudo porque o motorista do Monza não respeitou o sinal vermelho e passou, ele acabou batendo também em um caminhão estacionado em frente à Loja do Baú. Meu celular toca e é meu patrão, me liga para passar a pauta de uma reunião. Fiquei ali mais um minuto e já ouvi a ambulância do Corpo de Bombeiros chegando. Apertei o passo para chegar a tempo na reunião, mas a rotina não apaziguou minha intensa indignação.
Não quero perder as esperanças no ser humano! Não posso Senhor! Coloque amor no meu coração para que nunca aprove a morte como solução. Me dê esperança para viver cada dia. Ah, Senhor também desejo a tua paz. Vou cantar baixinho agora, paz, paz Cristo .... que sempre ouvia na missão de domingo.
1 comentários:
Não sou capaz de descrever o que sinto lendo esse artigo... não sou capaz de pensar diferente e nem ao menos sou capaz de não por as mãos no rosto em quase desespero diante de tanta crueldade que alguns "humanos" são capasez de realizar... não dá pra chamar esses "seres humanos" de animais, animais não fazem essas coisas, animais, matam por fome ou proteção, mas nunca indevidamente, nunca de maneira inconsequente... rezo por dias melhores, rezo para existirem mais pessoas assim - como você.
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