Pra onde este ônibus vai?

Antônio sai do bar da Vera, na Rua Ponta Grossa, onde acabou de tomar sua última dose de pinga e olha apreensivo para os veículos que passam. Ele se aproxima mais um pouco do meio-fio, dá uma viradinha para o lado direito para enxergar melhor o tráfego no horário do rush.

Os ônibus se aproximam, e ele começa a perguntar pra onde este vai? Para o Afonso Camargo. Encosta outro. E este? Vila nova? Passa a mão na pele avermelhada pela pinga e recortada pelo tempo, arruma a camisa e torna e perguntar: para onde este ônibus vai? Dom Romeu. Menina, menina, e aquele outro, para onde vai? Moro no Castelo Branco, mas num sei ler. Aprendi a fazer conta sozinho, mas lê num sei. Todo dia na hora de pegar o ônibus é esse sufoco.

Senhor aquele que vem é do Castelo. Ele se afasta e faz a mesma pergunta para um rapaz, depois para uma senhora que chega abarrotada de sacolas do supermercado e certifica: vai para o Castelo Branco. O ônibus encosta e ele entra no coletivo carregando um misto de vergonha e humilhação.

Antônio é um dos indivíduos que faz parte dos 7% de analfabetos no Brasil. Outros Antônios, Josés, joãos, Pedros, Marias, Juracis, Beneditas, Claras complementam a lista. Vinte e um por cento da população brasileira sabe ler de forma rudimentar, ou seja, conseguem localizar informações explícitas em textos curtos. Conforme a Unesco, 25% da população brasileira com mais de 15 anos são analfabetos funcionais, pessoas com menos de 4 anos de estudo completos.


Entrar num ônibus certo é só uma das limitações dos analfabetos. Mesmo depois de séculos da invenção da escrita, as letras continuam excluindo. O Brasil, de acordo com a Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação (Clade), concentra mais de um terço da população analfabeta da América Latina, 14 milhões de pessoas com 15 anos ou mais que não sabem ler e escrever, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2007, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Segundo as informações averiguadas pela Clade, um percentual de 11,4% de analfabetos entre a população com mais de 15 anos de idade, a média brasileira fica atrás, por exemplo, dos índices do México (9,10%), Equador (9%), Panamá (8,10%) e da Colômbia (7%).

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