Vanuza Borges
A depressão é uma síndrome psíquica caracterizada por desânimo, sentimentos de melancolia, irritação ou medo. Identificá-la, porém, não é tão simples quanto a sua definição. Conhecida como a doença do século XXI, atinge hoje cerca de 450 milhões de pessoas no mundo, segundo levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Nas próximas duas décadas, segundo a mesma pesquisa, a depressão tende a ser a patologia mais comum em todos os continentes, superando o câncer e as doenças cardíacas. Mesmo com informações tão contundentes, ainda sobram resistência, preconceito e dúvidas sobre tratamento, prevenção e cura. Por anos a fio, os depressivos foram vistos como pessoas “frescas” ou loucas. Este estigma ainda persiste, levando muitos a não procurar atendimento médico. Segundo o psicólogo Gleyson Reis, 36 anos, de Apucarana, é muito difícil aceitar nossas fraquezas. Por isso, num primeiro momento, é comum negar. “Um dos sintomas mais comuns para esconder essas falhas é o isolamento. A pessoa procura ficar sozinha para mais ninguém perceber”, pontua. De acordo com ele, a negação é o primeiro mecanismo de defesa e a aceitação, o último.
A demora em admitir a depressão faz com que muitos passem por quadros depressivos sem procurar ajuda para o problema, tornando a patologia recorrente. Segundo o Ministério da Saúde, 25% dos casos são crônicos. A subjetividade é tida como o grande limitador, diferente de outras doenças em que os sintomas são visíveis.
“Coisa de desocupado”
Segundo a psicóloga, Débora Mengazzo, 37 anos, de Apucarana, a maioria dos pacientes consegue continuar trabalhando ou cumprindo suas tarefas diárias, apesar de fazer com mais esforço e menor rendimento.
“Infelizmente, muitas pessoas passam por quadros depressivos acentuados e logo que melhoram abandonam o tratamento. Esta atitude torna-as vulnerável ao estresse, leve desânimo e irritação”, argumenta. De acordo com a profissional, existem, ainda, quadros crônicos desde seu início, que se prolongam por anos, com melhoras pouco significativas e retornos depressivos fortes.
A psicóloga alerta que a depressão não está associada somente ao caráter melancólico. “Pessoas muito irritadas, impacientes e nervosas também podem estar depressivas”, diz.
Uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2000, mostrou que o número de mulheres com depressão unipolar quase o dobro a de homens. A prevalência de episódios é de 1,9 por cento no sexo masculino e de 3,2 por cento no sexo feminino. A vulnerabilidade da mulher é maior no período pós-parto, na menopausa e pós-menopausa.
Mulheres lideram o ranking
Para o psicólogo Gleyson Reis, historicamente as mulheres absorvem mais os sentimentos, toleram mais certas coisas que as insatisfazem, principalmente nos relacionamentos afetivos. Essa postura, com o tempo, leva a desacreditar no seu próprio potencial. “Altera a maneira de se perceber, afetando a auto-estima e levando à depressão”, sustenta.
Histórico Familiar
De acordo com estudos, ter um dos pais com depressão aumenta de 2 a 4 vezes o risco da criança desenvolver a doença ao longo da vida. “As tendências se repetem, seguindo os mesmos motivos. A predisposição precisa ser alimentada. O ambiente que vai emitir os estímulos determinantes. Se uma criança cresce em uma casa com pais tristes vai assimilar que a tristeza é normal ou pode achar que ela é a causa da tristeza”, explica o psicólogo.
Reis observa que a depressão não tem idade. Entretanto, é na fase adulta, entre os 20 e 40 anos, que compreende o maior índice de casos.
SINTOMAS
• Alteração do apetite (falta ou excesso de apetite);
• Distúrbios do sono (sonolência ou insônia);
• Fadiga, cansaço e perda de energia;
• Sentimentos de inutilidade, culpa, falta de confiança e baixa auto-estima;
• Prejuízos da concentração e memória;
• Pensamentos negativos, ideias recorrentes ou desejo de morte;
• Desinteresse, apatia e tristeza;
• Alterações do desejo sexual;
• Irritabilidade;
• Manifestação de sintomas físicos, como enjoos, dores musculares e abdominais.
CAUSAS
A depressão age de forma peculiar em cada pessoa. Pode ter origem espontânea ou ser desencadeada por fatores orgânicos ou ambientais, observa a psicóloga Débora Menegazzo. “Para um diagnóstico correto, os sintomas devem ser persistentes, porque todos nós podemos passar por episódios de tristeza, raiva, desânimo ou irritação”, afirma. O recomendado, de acordo com a OMS, é procurar a ajuda de um profissional de saúde sempre que esses sintomas persistam de forma aguda por mais de duas semanas.
As causas, segundo Débora, geralmente, estão associadas à interpretação pessoal dos eventos da vida e das habilidades que possui. Ela ainda acrescenta que a perda de pessoas queridas, dificuldades relativas a emprego, mudança de cidade, problemas financeiros e expectativas não alcançadas também influenciam. Além desses motivos, os de ordem médica deixam os pacientes vulneráveis, como câncer, doenças cardíacas, diabetes, tireóide, Parkinson, Alzheimer, epilepsia, infecção por HIV e derrame cerebral.
GRUPOS DE RISCO
• Histórico familiar de depressão;
• Sexo feminino – incidência da doença é maior em mulheres, principalmente no período pós-parto, na menopausa e pós-menopausa;
• Idade mais avançada;
• Episódios anteriores de depressão;
• Acontecimentos estressantes;
• Dependência de droga;
. Pessoas com tendência para ansiedade e pânico.
TRATAMENTO E CURA
A depressão é considerada uma das patologias mais tratáveis da medicina e da psicologia, analisa a psicóloga Débora Menegazzo. “Os depressivos jamais devem desistir de recuperar a saúde e não se acomodar com maus resultados ou recuperação incompleta”, frisa a psicóloga.
De acordo com a profissional, o tratamento se baseia em várias medidas, envolvendo medicamentos antidepressivos e ansiolíticos, psicoterapia, recondicionamento físico e atitudes voltadas à recuperação da qualidade de vida.
Para obter a cura completa e evitar recaídas, Gleyson Reis enfatiza que é necessário aguardar a alta. “Alguns casos são tratáveis somente com terapias, enquanto outros necessitam ser complementados com medicamentos. A terapia vai identificar a causa e o remédio vai melhorar o humor em um curto espaço de tempo, auxiliando na recuperação”, diz.
Segundo ele, quase 100% dos pacientes que fazem o tratamento completo ficam curados. Reis recomenda que a família leve a pessoa com sintomas depressivos ao serviço de saúde, sem questionar muito. “Tentar não invadir o espaço dela. Ficar conversando demais, porque, às vezes, o assunto incomoda. O ideal é levar ao consultório e ficar de olho, principalmente quando há tendência de suicídio”, aconselha.
O apoio da família é essencial, mas, segundo Débora, tentar motivar demais ou cobrar “força de vontade” do doente pode acabar prejudicando o quadro. “Compreensão, apoio, incentivo adequado e atenção são alguns comportamentos importantes para quem está próximo da pessoa doente”, diz. Ela indica também a leitura de livros, revistas e sites especializados sobre o tema para a família. “A informação ajuda a compreender melhor a doença e o paciente”, assinala.
RECAÍDAS E SUPERAÇÃO
Durante uma atividade com colegas de trabalho, Lúcia*, 43 anos, descobriu que andava ansiosa demais. A reunião motivacional havia sido organizada por uma psicóloga para avaliar o comportamento dos funcionários. “Ela passou um exercício e fiz em apenas 15 minutos. Quando entreguei, a psicóloga sugeriu que procurasse ajuda profissional, porque o tempo estimado para realizar a tarefa era uma hora e meia”, recorda.
Lúcia não relutou. “Procurei de imediato. Há algum tempo não dormia direito, estava com insônia e muito estressada. Demorei a perceber que o meu ritmo apressadinho estava me judiando. Fazia três, até quatro coisas ao mesmo tempo”, conta ela, que, além de mãe, esposa e dona de casa, mantinha uma rotina de dois empregos e ainda fazia faculdade à noite
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Ela fez terapia durante um ano, mas só o acompanhamento psicológico não foi suficiente. “Também precisei tomar remédios”, confessa.
Tão logo se sentiu melhor, Lúcia abandonou o tratamento por conta própria. No entanto, o que ela não esperava aconteceu: a depressão voltou. “Um sentimento de solidão me invadiu, um desânimo total, chorava demais, não saía de casa, nada me satisfazia”, lembra. Lúcia voltou a fazer terapia e a tomar remédios por dois anos. Há seis meses, recebeu alta.
Ela faz questão de enfatizar que o apoio da família e a fé em Deus foram essenciais para o processo de cura. “Em casa, o tratamento foi coletivo. Eles tiveram muita paciência e foram persistentes. Não desistiram de mim”, diz.
*Nome fictício para preservar a identidade da vítima.
Matéria publicada na Revista UAL/Jornal Tribuna do Norte de Apucarana